Em 1886, o mundo medico voltou os olhos para uma pequena
clinica em Strasburgo, na Alsacia alemã, para informações sobre o aparelho
digestivo e sua função. Guiados pelo Dr Adolf Kussmaul um grupo de jovens
estudantes testava os efeitos de muitos elementos químicos na digestão. E
operando com terrificantes bombas estomacais, eles aprenderam a inundar o
estomago de seus pobres pacientes. Procuravam remédios para todas as doenças
intestinais causadas por germens e parasitas.
Certo dia dois desses rapazes receberam uma ordem.
- Senhores, disse o professor Kussmaul, tenho um belo
problema para ambos. Há aqui malvado vermes que penetra no intestino e fura as
tripas. Talvez vocês encontrem uma droga que os mate, sem matar ou prejudicar o
paciente.
Os incumbidos do problema foram Arnold Cahn e Paul Hepp,
o primeiro já a especializar-se em ácidos do estomago e o segundo no ataque a
triquinose. Nenhum dos dois gostou da tarefa que o mestre lhes atribuía.
- Vermes, vermes! Rosnou Cahn. Não gosto de trabalhar em
vermes. Isso cabe a você, Paul, que é o perito em vermes aqui no nosso grupo.
- Sei, tornou Hepp. Você não quer, nem eu – mas o mestre
mandou e temos de obedecer. O melhor é começarmos já, para acabarmos a coisa o
mais depressa possível. Mas por onde começar?
- Hum... Podemos experimentar com a nossa naftalina, se é
que ainda existe. Todos andam aqui a usa-la. E voltando-se para alguém: “Oh lá,
Julius! Venha cá”.
Um lavador de vidros, de lerda, aproximou-se.
- Vá ao quarto das drogas e diga a Schmidtzie que
precisamos dum pouco de naftalina, ai umas 50 gramas, se é que não comeram
tudo.
Julius encaminhou-se sonolentamente para o deposito de
drogas onde Herr Schmidt imperava, e deu o recado. Uma hora mais tarde Schmidt
em pessoa vinha fazer a entrega da droga pedida.
- herr Doutor, disse ela a Cahn, não tenho bastante naftalina no vidro grande, mas trago
aqui um vidro ainda não aberto. Não sei bem se é naftalina, porque o rotulo
está estragado. Parece que é.
Cahn espiou o que restava do rotulo e disse:
- Sim, é naftalina. Deixe o vidro conosco. Com certeza
vamos usar tudo.
Uma semana depois os dois assistentes ainda estavam
procurando matar vermes com aquela “naftalina”, e a droga não agia (eles nem
haviam cheirado o vidro! A naftalina cheira como aquelas bolas de matar
traças). Não matava vermes.
Por fim Paul Hepp agarrou o vidro, dizendo:
- espere um pouco. Vou ver se esta porcaria cura alguma
coisa! Tenho um doente no consultório com a barriga cheia de tudo que os livros
trazem. Vamos ver o que esta naftalina faz com a bicharia dele.
Tres horas mais tarde Hepp corria para a mesa de Cahn.
- Escute! Você sabia que a naftalina abate a febre?
- O diabo abate a febre tornou Cahn. Não sei quem em
Berlim já fez a experiência. Não abate nada.
- Não abate? Ou esse alguém está louco ou eu – mas duvido
muito que seja eu.
- Que quer dizer?
- O que estou dizendo. Sabe? Aquele meu doente com
bicharia nas tripas? Pois esta manhã estava com a temperatura cinco graus acima
do normal. Dei-lhe uma dose desta naftalina e meia hora depois a temperatura
desceu para o normal. Quem é o louco?
- Deixe-me ver isso, disse Cahn passando a mão no frasco
de naftalina; era o mesmo que Schmidt trouxera, o de rotulo estragado; Cahn
cheirou-o. Espere, Paul. Isto não é naftalina! Não tem cheiro de naftalina!...
Hepp arrepiou-se.
- E não sabemos o que é. E eu podia ter matado aquele
camarada lá na clinica! Escute: tenho um primo na fabrica de anilina de
Biebrich. E se o mandasse fazer a analise dito? Estou tonto...
Semanas depois os dois jovens de Strasburgo mandavam um
resumido artigo a um jornal de medicina de Berlim. “Por um feliz acidente”,
diziam eles, “um novo composto nos veioter às mãos, o qual se revela um
excelente febrífugo”. Investigado pelo Dr. E. Hepp, em Biebrich, verificou ele
ser uma substancia de há muito conhecida dos químicos – a acetanilida ... a
qual desejamos dar o nome de antifebrina.
Bibliografia:
Mágica em Garrafas, A história dos Grandes Medicamentos – Milton Silverman –
tradução de Monteiro Lobato – Cia Editora Nacional 1943