Arvores de Mangue |
O Mangue é uma planta dos nossos terrenos de marinha e só não conhece quem nunca se abalou do interior para as nossas praias. Quem a vê pela primeira vez quer logo saber o nome, tão esquisito se lhe mostra e tão diferente das outras plantas de serra acima. O que mais dá na vista desde logo é aquela propriedade sua em virtude da qual de certa altura para baixo emite ele galhos nus que, em vez de subirem, descem tortuosamente para a água salobra, nela se enterram com raízes e dela emergem mais adiante como um novo pé de mangue, sempre e indefinidamente, formando por baixo, acima do solo, um emaranhado de milhões e milhões de braços recurvos e lisos, que avançam para os troncos, enquanto por cima se lhes extende a copa verde clara, mas de um verde polido e metálico.
Os mangues de Santos são desprotegidos da câmara municipal daquela cidade. Por isso dia a dia rareiam e se encurtam, dizimados pela foice do lenhador, de modo que se as coisas assim continuarem, longe não estará o tempo em que virão desaparecer de todo. Além dessa devastação desenfreada que os reduz a feixes de lenha, têm eles ainda contra si a desvantagem de plantas mais ou menos ricas de tanino, de modo que à obras dos lenhadores se ajunta em não pequena escala a dos cortidores de couros. Desses mangues disse o padre Simão de Vasconcellos, na sua “Descrição de Bahia”, que eles galanteiam de verdura as margens das ribeiras e dos rios, “mui engraçados, não só; por verdes, mas por aquelas singulares laçadas com que a natureza vigorosa os inredou, porque do mais alto de seus braços lançam vergônteas a beber nas águas, e nestas, como luxuriando dos braços fazem pés, arraigam no fundo, criam raízes, e tornam a brotar ao alto, troncos diversos e diversos ramos”. Disse mais: -“Não dão estas árvores fruto algum; recompensam, porém com vários préstimos em proveito maior dos moradores, porque aqueles braços que dissemos lançam do alto a prender outra vez nas águas, formam cada um cinco e seis antes que cheguem á vasa, as quais, naquele espaço que lhe chegou a água das marés, se cobrem com tanta qualidade de ostras, umas sobre as outras, que talvez seja bastante um só pé destes para encher um cesto. Debaixo destas mesmas raízes se cria tanta cópia de caranguejos, que, sendo muitos milhares os moradores, principalmente serventes e escravos, a todos dão pasto cotidiano e gostoso só os que andam pelas margens dos rios. Com a folha destas árvores pisada se fazem os curtumes de toda courama do Brasil, muito mais brevemente que com o sumagre de Portugal; e com a casca pisada se dá a tinta vermelha e engraçada que tem os mesmos couros. “Dos seus troncos se fazem as melhores e mais incorruptíveis madeiras para todos os altos das casas, como são caibros, enchimentos e pilares; e vem á ser esta árvore infrutífera a de maiores préstimos”.
Bibliografia:
Alamanaque Agrícola Brasileiro – 1915 J. Silva
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