domingo, 31 de janeiro de 2016

A descoberta da quinina sintética

Em meados do século XVII estava o mundo com uma coleção de alcaloides, chefiados pela morfina e a quinina. Mas esta última neutralizava os seus altíssimos méritos com o excessivo do preço; os pobres não podiam usa-la. Em 1850 a Sociedade de Farmácia da França chamou para esse ponto a atenção dos químicos.

“Já de muito tempo entrou em foco o problema dum substituto mais barato para do quinino, ou da redução do preço do quinino, de modo que possa ter mais larga aplicação... Fazemos, portanto, um apelo... oferecendo um premio de quatro mil francos ao químico que descobrir o meio de preparar a quinina artificialmente...”
Os concorrentes deviam apresentar o resultado de seus trabalhos antes do dia 1º de janeiro de 1851, enviando no mínimo meia libra de quinina sintética.
Esse prêmio nunca foi reclamado, nem mesmo quando em 1940 os ditadores europeus e nipônicos começaram a disputar o domínio das plantações de quina nas Índias Orientais.
A quinina sintética continuava um sonho
Outros alcaloides iam sendo criados nos laboratórios, e produzidos sinteticamente em muito melhores condições de preço que o produto natural, mas a quinina resistiu ao engenho dos homens.
Quando a sociedade de Farmácia de França propôs aquele premio, de nenhum modo podia prever o que realmente sucedeu. Não podia prever que William Henry Perkin, um pesquisador inglês de 18 anos, ao tentar obter a quinina sintético obteria acidentalmente a primeira das anilinas extraídas do alcatrão.
Nem igualmente podia conceber que a incapacidade de criar a quinina sintético iria induzir os europeus a romper com o monopólio sul-americano, promovendo as plantações do Oriente.


Bibliografia: Mágica em Garrafas, A história dos Grandes Medicamentos – Milton Silverman – tradução de Monteiro Lobato – Cia Editora Nacional 1943

domingo, 24 de janeiro de 2016

Quinina abre a descoberta dos alcaloides.

Os dois farmacêuticos que isolaram a quinina, no começo, não tinham a certeza de terem descoberto um medicamento específico contra a Malária. Na verdade eles estavam com dois produtos diferentes, a serem experimentados no organismo humano. E concluiu a comunicação já iniciada manifestando a esperança de que algum hábil médico, “dos que reúnem a paciência a sagacidade”, fizesse as indispensáveis aplicações em seus doentes.
Tais provas não tardaram a ser feitas, e o resultado foi que se os primeiros cristais eram inócuos, o segundo produto, a quinina, produzia efeitos notáveis.  Um dos médicos,
François Magendie, fisiologista de renome que já tivera a coragem de experimentar em seus pacientes a morfina, o iodo, os brometos, a estriquinina, a brucina, a veratrina e a emetina, adicionou a quinina a sua lista. Logo depois um oficial francês, o Dr. Maillot, fez a prova da quina em Argel e Ajacio, parece que com resultados notáveis, pois lhe deram o nome a uma rua de Argel, e depois a uma aldeia, sendo finalmente pensionado.
Pelletier e Caventou não tiraram patente da descoberta, mas foram altamente recompensados; grandes honras lhes concedeu a França, nomeações importantes, o ambicionado prêmio Monthyon de dez mil francos, e Pelletier chegou até a ter estátua.
Depois de breve pausa para atender aos cumprimentos, saudações e homenagens, os dois cientistas voltaram ao trabalho. Pelletier isolou do ópio quatro novos alcaloides. Outros pesquisadores, franceses e alemães, foram-lhes nas águas e encontraram mais componentes na chinchona, e um jovem sábio francês, cujo nome estava apontado Louis Pasteur mostrou as relações de família entre todos os alcaloides da casca peruviana.
E vieram logo a seguir a cafeína do café, e a conina da cicuta, a nicotina do fumo, a atropina da beladona, a codeína e a papaverina do opio, a efedrina da lendária Ma Huang dos chineses, a escopolomina da escopola e a teofilina do chá.
Foi uma verdadeira torrente de descobertas, mas os dois homens que deram o impulso de partida não lhe assistiram a maré. Sertuerner morrera em 1841, aos 57 anos, e Pelletier no ano seguinte, com 54.
Sertuerner fora esquecido em vida; Pelletier teve mais sorte. O alcaloide encontrado na romã em 1877 recebeu o nome de pelleterina, um inimigo da tenia.

Bibliografia: Mágica em Garrafas, A história dos Grandes Medicamentos – Milton Silverman – tradução de Monteiro Lobato – Cia Editora Nacional 1943.


domingo, 17 de janeiro de 2016

Os estudos para descoberta da Quinina

Monsieur Caventou e Pelletier, seu amigo, resolveram ler tudo que havia sido publicado sobre alcaloides.
Os dois lançaram-se aos livros e velhos jornais, enfronharam-se do que havia sido feito em diversos países e sobre tudo em Portugal por um Dr Gomes. Vários estudiosos já tinham encontrado na casca da chinchona certos produtos químicos, nenhum dos quais, porém, curava a malária, nem parecia alcaloide. O que, aliás, não era de se estranhar, porque nenhum deles havia procurado o alcaloide. E se aquelas experiências fossem repetidas segundo o processo de Sertuerner ou segundo os desenvolvimentos por eles mesmos?
Mas quais, de tantas experiências, deveriam repetir? Depois de muita ponderação decidiram-se pela do Dr Gomes. Decoraram o processo, adicionaram melhoramentos e começaram.
A coisa era prodigiosamente simples, Aquilo que a Stertuerner custava anos de trabalho, aos franceses só tomou dias. Extraíram por meio de álcool o suco da chinchona, adicionaram um pouco de água e em seguida potassa – e nessa solução viram se formar aglomerados de cristais brancos que redissolvidos e novamente precipitados, deram um produto branco e brilhante. E os dois extasiados experimentadores tiveram a intuição de que ali estava um puro alcaloide – o específico da malária.
Mas erraram. Aquilo era a mesma coisa que Gomes havia revelado, apesar da modificação da técnica. Se eles tivessem parado naquele ponto teriam alcançado apenas um dos componentes da chinchona, sem força para a cura da malária.
Caventou, entretanto, que era inesgotável, salvou tudo.
- Espere, disse ele, vamos trabalhar mais um pouco antes de preparar a comunicação. A nossa experiência foi feita com a casca parda; façamos a mesma coisa com a casca amarela.
- Ora, ora! Volveu Pelletier. Casca parda ou amarela não passa da mesma coisa. Tudo e casca de chinchona.
- Não é, não! Eu conheço um homem que ...
-Bah! Exclamou Pelletier. Você anda sempre com essas historias dum homem que...
-espere – espere um minuto, insistiu Caventou. Esse homem sabe o que diz. É um médico. Escreveu um livro sobre a malária e diz que... Que é mesmo que ele diz? Ah – diz que as cascas de chinchona variam – ou pelo menos não produzem o mesmo efeito na malária. Disse que a amarela é que é  boa. Está vendo?
- Vendo? Vendo que?
- Oh!... e Caventou coçou a cabeça desanimado.
Preste atenção. Eu disse que estraímos o alcaloide da casca escura, está ouvindo?
- Continue
- Mas a casca escura é pobre – a amarela é que é a boa. E que sabemos nós da casca amarela – responda...
- Nada, está claro, porque não a estudamos.
-Pois é isso! É nisso que estou insistindo; precisamos estudar a casca amarela.
É a nova experiência começou. Com a melhor casca amarela existente no mercado repetiram a experiência com grande rigor – e nada de obterem cristais brancos, nada senão um precipitado pegajoso, uma espécie de goma que não se cristalizava de maneira nenhuma. Produto amargo e solúvel em ácidos e no álcool – e, ao contrario do primeiro, solúvel também no éter. Evidentemente era uma coisa nova.
A descoberta foi descrita em 1820, tempo em que Pelletier estava com 32 anos e Caventou com 27; e ao novo alcaloide deram um nome tirado da denominação peruana da chinchona: Quinina.


Bibliografia: Mágica em Garrafas, A história dos Grandes Medicamentos – Milton Silverman – tradução de Monteiro Lobato – Cia Editora Nacional 1943

domingo, 10 de janeiro de 2016

Muito prazer, Alcaloides.

As experiências de laboratório mostravam que tanto a emetina como a estriquinina assemelhavam-se a morfina de Sertuerner. Atuavam como álcalis, reagiam como álcalis, tinham todas as propriedades dos álcalis, embora não tivessem a formula dos álcalis.
- Surge aqui, proclamou na Alemanha o químico Meissner, toda uma nova família de produtos químicos. Provêm todos das plantas, são orgânicos, mas pelas suas semelhanças com os álcalis podem ser chamados alcaloides.

Logo depois Pelletier e Caventou descobriram outro alcaloide, a brucina, extraída da casca da falsa angostura, e quase ao mesmo tempo Meissner apresentava a veratrina, extraída da cevadilha, e outros investigadores produziram a piperina, extraída da pimenta e a delfinína, extraída das plantas delphinum.
Mas Pelletier era acima de tudo um farmacêutico pratico e também um homem   prático. “Estes novos alcaloides, disse ele, “são muito interessantes, mas de pouca utilidade. Qual valor comercial podem ter ? A estriquinina, a brucina, a veratrina e o resto não passam de curiosidades científicas sem interesse para ninguém. Precisamos descobrir coisas mais preciosas.”
Caventou abriu o caminho. Era um rapaz sempre alerta, muito perguntador, dos que metem o nariz em tudo e não perdem nada. Vivia fazendo cem coisas ao mesmo tempo, e pensando em mil outras.
Embora colaborador de Pelletier naqueles trabalhos, seguia também as lições do professor Thénard, e foi no laboratório desse cientista que lhe veio à ideia. Caventou ouviu a um assistente de Thénrad a seguinte observação: “Demos com uma coisa interessante. O professor pediu-me ontem que preparasse um extrato de chinchona para demonstração na aula, e meu extrato me pareceu extremamente alcalino, e fui eu então e...”
Bastou aquilo. Caventou sacou fora o avental e foi voando ao encontro de Pelletier.
-Pierre, precisamos começar imediatamente a estudar a chinchona!...
Pelletier franziu a testa. A ele, como o superior hierárquico naquela dupla , é que competia sugerir os trabalhos a serem feitos.
-Por que precisamos estudar a chinchona? Pergunta irônica e friamente.
-Porque é a mais importante das drogas, respondeu Caventou. Cura a malária, uma doença que mata milhares de criaturas, talvez milhões anualmente.
-Bem, disse Pelletier, se é essa a razão, nesse caso temos de nos voltar para a tísica ou a peste, que mata mais gente – mata muito mais milhões.
Caventou não se deu por vencido.
-Pode ser verdade, mas a malária... Olhe: a chinchona cura malária. Sabemos disso! E na chinchona há um alcaloide...
-Espere gritou Pelletier. Quem disse que há um alcaloide na chinchona? Onde ouviu isso?
-De Monsieur Labillardiere, no laboratório de Thénard. É um dos seus assistentes. Disse-me esta manhã que havia preparado um extrato de chinchona e o gosto era alcalino...
- Gosto alcalino? Isso não quer dizer nada. Talvez alguma impureza – um pouco de potassa ou soda. Esse gosto não prova que na chincona há um alcaloide., mas... Joseph, meu amigo, vamos ler o que há a respeito da Chinchona...


Bibliografia: Mágica em Garrafas, A história dos Grandes Medicamentos – Milton Silverman – tradução de Monteiro Lobato – Cia Editora Nacional 1943

domingo, 3 de janeiro de 2016

O Encontro dos Alcalóides.

Por meio século após a morte de Talbot da revelação do seu segredo a história da casca do Perú correu serena. Seus raros oponentes foram postos a margem, e em honra à condessa de Chinchon os botânicos mudaram o nome de árvores da quina quina para Chinchona.
Planta altamente tóxica.

Mais tarde, lá pelo meio do século XVIII, uns tantos pesquisadores europeus começaram a atentar na chinchona. Muito interessante para a ciência saber o que a tal casca encerrava; já os homens da simples pratica só procuravam um meio de distinguir entre a chinchona pura e a adulterada.
Vieram numerosas alterações, da Suecia, da França, da Alemanhã, de Portugal, Russia e Escócia, sobre o encontro do principio essencial da chinchona. Em Paris, um Armand Seguin negocista e falsificador de drogas já com uma estada na prisão, anunciou a notável (e falsa) descoberta de que a boa casca de chinchona era rica em gelatina....”É nessa gelatina que está o princípio ativo da casca. É a gelatina que cura a malária”. Mas a gelatina não cura coisa nenhuma, como o próprio Seguin o verificou e também os pobres médicos que a seu conselho se puseram a tratar os maláricos com produtos gelatinosos.
Depois veio o famoso Antonie François Fourcroy, o professor francês que se sobressaía sobre os seus competidores ou mandava-os para a guilhotina. Fourcroy produziu uma serie de manipulações químicas e afinal apresentou uma substancia parda, sem sabor nem cheiro, a qual deu nome de “chinchona vermelha”. Ao contrário do que alegava esse produto não exercia efeito nenhum na malária. Apesar disso Fourcroy chegou à beira do triunfo. “Estas pesquisas”, concluiu ele, vão nos conduzir a descoberta de substancias “antimaláricas”.
Estava certo. Se insistisse naquilo uns dias mais, talvez ele próprio tivesse feito à estupenda descoberta. Isso, entretanto, estava destinado de outra maneira, iria caber a dois jovens químicos de Paris, Pierre Joseph Pelletier rapaz de 29 anos, filho de farmacêutico e já professor da Escola de Farmácia, e Joseph Bienaimé Caventou, um lépido estudante de farmácia de 24 anos.
Reuniram-se pela primeira vez em 1817 ano em que apareceu pela primeira vez o fecundo relatório do Sertauerner sobre a morfina. Nunca um relatório foi devorado com maior avidez.
- O método deste homem é admirável, disse Pelletier. É simples e eficientíssimo. Se por este processo ele encontrou a morfina no ópio, talvez possamos encontrar outros princípios ativos em outras plantas.
E começaram os estudos com a ipeca, um novo emético vindo da América do Sul, boa para a disenteria – e disso saiu a emetina. Depois se voltaram para a venenosa strychnos ou a noz vômica e dessa planta extraíram um poderoso veneno que causava a morte depois de convulsões, espasmos, espuma na boca e terrível ritus sardônico (o “riso sardônico” provem da Sardenha, a pátria da strychnos).  Pelletier e Caventou pensaram em dar ao novo produto o nome de vauqueline, em honra a um amigo, Monsieur Vauquelin; mas foram aconselhados a desistirem da ideia. Vauquelin podia não gostar de ver o seu nome ligado a um tão cruel veneno – e o nome adotado foi o de strychnine ou estriquinina.
Bibliografia: Mágica em Garrafas, A história dos Grandes Medicamentos – Milton Silverman – tradução de Monteiro Lobato – Cia Editora Nacional 1943.