sábado, 21 de maio de 2016

O valor de uma droga depende de quem a administra

A história da digitális não estava completa em todos os seus detalhes, como ainda não está até hoje, mas havia assentado as suas linhas mestras. Isso, entretanto, não evitava que grandes médicos fizessem ouvidos moucos e a pusessem de lado.
Quem era afinal de contas, esse Mackenzie? Um prático apenas. E quem era Cushny? Um selvajão que viera de Michigan com estranhas novidades na cabeça. E Weckebach? Um sonhador lá da Holanda.

Finalmente em 1910, Mackenzie em pessoa conduziu o ataque contra a Harley Street, o feroz reduto do conservantismo hipocrático. Provou que os grandes especialistas da Harley Street estavam sacrificando os seus pacientes com a teima de não atentar nos conhecimentos adquiridos. Mackenzie foi ouvido – mas não como queria.
Anos antes havia inventado um aparelho para auscultar o coração. A gente da Harley Street exclamou: “Céus! Eis aqui um grande inventor, embora seja médico rural. Elejamo-lo para o Colégio de Médicos. Concedamos-lhe honras e uma posição remunerada”.
Mackenzie beneficiou-se com as honras e uma condecoração. Mas o novo Sir James Mackenzie era o mesmo velho Dr Mackenzie que não gostava de ver doente morrerem em consequência da teimosia anticientífica. Desagradava-lhe
Ver-se aplaudido por ter inventado um simples aparelho e não pela descoberta do mecanismo da hidropisia. Mas a Haley Street não percebia nada. Continuavam a honra-lo apenas por causa da invenção.
Só muito tempo depois é que a vitória científica da digitális se afirmou. Cushny e Mackenzie já estavam mortos e Wenckebach se aposentara; mas os discípulos desses três grandes homens se fizeram campeões de suas ideias. Hoje, graças a esse esforço, a medicina moderna sabe o que é e o que não é a digitalis. Tais homens completaram a grande vitória da medicina sobre as doenças do coração e também ensinaram aos caçadores-de-drogas uma lição fundamental: O valor de uma droga é em parte determinado pelo cérebro do homem que a administra.
Durante anos, armados de fatos, os cientistas lutavam contra a superstição e a ignorância, só alguns médicos haviam notado que a digitális influía no coração. Se viesse a falhar nessa influencia no coração, ai do doente!
Mas isso vinha da má memoria dos médicos, porque durante séculos, antes do conhecimento da digitális, já havia tratamento para os hidrópicos. Usavam a cila e a cebola marinha do Mediterrâneo. Usava cozimento de folhas de loendro outro velho medicamento cardíaco.

Bibliografia: Mágica em Garrafas, A história dos Grandes Medicamentos – Milton Silverman – tradução de Monteiro Lobato – Cia Editora Nacional 1943

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