O anuncio da descoberta da cocaína veio com outro ainda
mais significativo. “Levando á boca uma pitada de cocaína”... , declarou
Niemann, “notei, com surpresa, que a língua me ficara insensível aos sabores e
ao frio ou calor...”
Com surpresa! Lá estava um produto químico produtor de
anestesia local! Infelizmente Niemann só era químico e ignorava que os médicos
venderiam a alma por um produto como aquele.
Também não pensou nisso o farmacêutico vienense que três
anos mais tarde leu num obscuro jornal que a cocaína produzia insensibilidade
na língua, na boca e na garganta. Nem o oculista alemão que hilariamente
descreveu a cocaína para grupo de especialistas de moléstias dos olhos do
nariz e da garganta.
Um fisiologista russo produziu uma alentada comunicação
sobre a interessante insensibilidade produzida em animais por meio da aplicação
de soluções de cocaína; e um médico peruano usou compressas de cocaína para
suprimir a dor nas escoriações, mas não deu ao caso maior importância.
Thomaz Moreno y Maiz, antigo cirurgião do exército
peruano, fez um serio estudo da cocaína. “Dizem que a evita a fome, reduz a
necessidade de alimento – mas será assim?”
Maiz tomou certo numero de ratos gordos e dividiu-os em
dois grupos. A um dos grupos só deu coca; a outro, coisa nenhuma – e pôs-se a
observar o fim de uma lenda; os ratos em regime de cocaína morreram antes que
os companheiros que estavam no regime de coisa nenhuma.
Depois tomou sapos e injetou-lhes solução de cocaína nas
pernas traseiras; cutucando essas pernas com ponta de agulha o sapo não saltou,
nem deu sinal de haver sentido.
“A sensibilidade das pernas injetadas desapareceu por
completo”, anotou Maiz. Depois enterrou a agulha até alcançar o nervo do
movimento – e o sapo moveu-se! “A sensação está completamente abolida”, anotou
ele “mas, por estranho que o pareça, a motilidade persiste”.
Depois cutucou com a agulha as pernas dianteiras não
injetadas – e a cada toque o animal deu um pulo de dor, Moreno e Maiz: concluíram:
“A ação local desta substância é muito marcada”. E em observação á margem: “Será
possível utilizar a cocaína como anestésico local”? “Não podemos concluir com
base no pequeno numero de experiências, que fizemos, o que o futuro vai decidir”
– e com essas palavras o bom cientista peruviano lançou a fama pela janela.
Bibliografia:
Mágica em Garrafas, A história dos Grandes Medicamentos – Milton Silverman –
tradução de Monteiro Lobato – Cia Editora Nacional 1943.
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