sábado, 6 de agosto de 2016

A cocaína como anestésico na cirurgia de cataratas

Três médicos resolveram estudar os efeitos da cocaína em seres humano. Sigmund Freud, que mais tarde iria dar ao mundo a psicanálise, Carl Koller e Leonard Koenigstein. Trabalhando semanas com a cocaína, experimentaram primeiro em cobaias e depois em si mesmos. Fizeram provas de pressão sanguínea, pulsações, respiração. Encheram de notas paginas e páginas.
Karl Koller
Depois de longa serie de testes, Freud anunciou que ia sair de férias.
- Todo arrumei na minha clínica de modo a poder viajar. Creio que vou para a Holanada... Há lá certa moça que quero ver. Vocês continuarão o trabalho sem mim. Tomem a cocaína por via oral e observem os efeitos na respiração. Experimentem também o dinamômetro. Vejam como a cocaína age nas feridas e partiu.
Koenigstein olhou para Koller.
- Parece que o nosso bom amigo não quer que tomemos férias. Mas essa sua última sugestão... estou com vontade de saber como a cocaína se comporta na infecção dos olhos.
Vou a clínica amanhã experimentar no tracoma.
Koller concordou.
- Hum... Pode dar algum resultado curioso, sim.
Outras semanas se passaram, com Koller a estudar os efeitos da cocaína na respiração e Koenigstein a desapontar-se com a cocaína nas infecções dos olhos.
Era Koller um excelente experimentador, já conhecido pelos seus estudos de embriologia e efeito dos tóxicos em animais - mas o estudo da cocaína arrastava-se e começou a aborrecê-lo. Como quisesse especializar-se em doenças dos olhos, lamentou o tempo que andava a perder com a cocaína em vez de ouvir os grandes oftalmologistas de Viena.
Um destes sábios muito impressionou Koller com suas observações: “Senhores”, dissera ele, ”a oftalmologia esta clamando por uma nova droga que tenha efeito anestésico local. Os anestésicos existentes, clorofórmio, éter e oxido nitroso, não se prestam para o caso. Muito perigoso na oftalmologia, sempre seguidos de náuseas e vômitos que destroem os delicados trabalhos que fazemos nos olhos. E infelizmente também não pode usar a morfina e os brometos. Enquanto não encontrarmos um composto que pingado no olho produzem a anestesia local, nada podemos fazer na catarata, na iritis e em tantas outras moléstias dos olhos.”
Curar a cegueira produzida pela catarata! Era o que tal droga faria se por acaso tal droga pudesse existir.
Estas palavras não saiam da cabeça de Koller, quando, de volta ao laboratório, pingou cocaína em sua língua e a sentiu insensibilizar-se. Se houvesse uma droga que fizesse nos olhos o que a cocaína fazia na língua... Koller tocou na ponta da língua e não teve sensação de toque. Beliscou-a e nada. Um caso, pois, de anestesia local – Todo mundo sabia disso, mas ninguém aproveitava aquele conhecimento.
Subito, uma ideia – e Koller gritou:
- Leonard! Leonard Koenigstein!
_ Que há? Gritou a voz vizinha.
_ Descobri Leonard! Descobri um anestésico local para os olhos! É a cocaína!...
- Você está louco. Já experimentou?
- Não, respondeu Koller, excitadíssimo, mas vou experimentar, e já.
Tomou varias coisas, meteu-as no bolso e saiu atrás do servente.
- Arranje-me algumas rãs e duas cobaias. Já! Preciso que me ajude por alguns minutos.
Enquanto o rapaz segurava em posição a primeira rã verde, Koller enchia a seringa com uma solução de cocaína e pingava uma gota nos olhos.
- Segure-a firme. É preciso que a solução de cocaína escorra de um olho para o outro.
Esperaram trinta segundos, um minuto, dois – e então Koller fez a experiência: tocou no olho da rã que nada recebera, e ela lutou para fugir.
- Ótimo doeu. Incomodou-se. Vamos ver o olho cocainizado. Segure firme.
Repetiu o toque no segundo olho e – milagre dos milagres! – a rã não fez caso. Koller insistiu, arranhou o olho da rã – e ela nada de reagir. Arranhou mais forte, e sempre nada. A rã não dava sinal de sentir coisa nenhuma: estava apenas incomodada de estar se prestando para aquilo.
Com este experimento Koller entendeu que a cocaína anestesiou completamente o olho: é, portanto, um perfeito anestésico local.

Bibliografia: Mágica em Garrafas, A história dos Grandes Medicamentos – Milton Silverman – tradução de Monteiro Lobato – Cia Editora Nacional 1943.

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