No dia seguinte, depois de Kolbe ter prometido a Tjiersch
que conhecia a formula para sintetizar o ácido salicílico extraído do ácido carbólico,
foi bem cedo ao laboratório da Universidade de Leipzig, atravessou as salas,
passou, sem dizer nada aos estudantes e entrou em seu gabinete . De lá, pela
porta entreaberta, deu uma ordem seca.
- Otto, um pouco de acido carbólico! Frederick prepare o
gerador de dióxido de carbono. E você Ludwig, traga o novo frasco de soda
caustica.
Meia hora depois aquele terrível inimigo do erro, que era
Kolbe, estava cometendo o maior dos erros que a historia química menciona – um abençoado
erro que iria abrir todo um novo campo da terapêutica!
- Olha aqui, disse Kolbe a um de seus assistentes. Vou
repetir uma pequena experiência que realizei há anos em Marburg. Otto faça o
favor – a folha... Vamos produzir um pouco de acido salicílico – passe-me esse
tubo, Ludwig! – e vamos matar micróbios. Estão ouvindo rapazes? Vamos curar
todas as doenças do mundo. Vamos de agora em diante ser matadores de germens.
- Mas, Herr Professor, nós somos químicos, alegou um dos
rapazes. Não sabemos matar germes. Como vamos começar?
Kolbe olhou-o de esguelha.
- Começar? Ach, estamos já quase no fim. Enquanto
Vocês moços dormiam, eu meditava. Enquanto vocês jogam e
brincam, o professor pensa.
Os assistentes entreolharam-se e deram de ombros.
- Herr, professor, disse Ludwig, enquanto estávamos jogando
e brincando, que é que o senhor pensou?
- Pensei, respondeu Kolbe, que vamos produzir algum acido
salicílico e com ele matar germes.
- Mas...
- Faça o favor de não discordar. Querem saber por que o
acido salicílico vai matar germens? Direi. Porque o acido salicílico lentamente se
transforma em carbólico e o acido carbólico mata germes.
- Mas então porque não usa o ácido carbólico?
Kolbe desfranziu a testa.
- Ach, que assistente tenho eu! Porque o acido carbólico é
muito perigoso e o acido salicílico é perfeitamente seguro. Se você apanha o cólera,
tudo o que tem a fazer é tomar uma Boa solução de acido salicílico, que é
perfeitamente seguro – e estará livre dos micróbios do cólera.
Tudo isso não passa de suposições teóricas, fáceis de
serem testadas, de modo que aqueles estudantes de Leipzig sem mais delongas se
viram transformados em caçadores de micróbios. O primeiro passo, a produção de
ácido salicílico, foi coisa fácil para tão hábeis químicos, mas aquilo em
germes e micróbios isso já seria outra historia. Nenhum deles tinha a menor técnica
a respeito.
E encheram o laboratório de vasilhas de carne em decomposição
ou leite azedo. Desajeitadamente procuravam no microscópio os pequeninos asfixiavam-se
com o cheiro de carne podre. Procuravam impedir a fermentação do chope de Leipzig
e matar terríveis assassinos microscópicos em cadáveres humanos.
Kolbe não sai dali.
- Rapazes, vocês viram que este leite azeda em três dias,
mas que se lhe juntarmos acido salicílico permanece fresco por uma semana.
Ótimo, ótimo! Foi o acido salicílico que o preservou. Como? Transformando-se em
ácido carbólico! E Kolbe ia enchendo o bolso com papei de anotações.
- Com que então, Otto, o acido salicílico impediu por um
mês que esta carne apodrecesse. Ótimo, Otto! Ótimo!
- Verificou que o acido salicílico impede o vinho de
azedar, Ludwig? Excelente, meu rapaz. Excelente!
E foram meses e meses daquele trabalho, daquela loucura
experimental.
Kolbe e seus auxiliares faziam centenas de testes, mas
com a maior imprecisão. Eram testes que se fossem feitos em outro laboratório incorreriam
na severa censura de todos. Mas, ali, estavam procurando provar uma teoria...
Bibliografia:
Mágica em Garrafas, A história dos Grandes Medicamentos – Milton Silverman –
tradução de Monteiro Lobato – Cia Editora Nacional 1943
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